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Economia

Correios: A caminho do Senado, efeito da desestatização divide analistas

De acordo com o texto aprovado, a empresa que se tornar dona dos Correios poderá definir preços, condições e reajustes de preços

(Foto: Minervino Junior)

Após a aprovação do texto-base da privatização dos Correios na Câmara dos Deputados, há uma divisão entre quem acredita que a medida pode melhorar os serviços e diminuir preços, com o aumento da competitividade, e aqueles que avaliam que os serviços ficarão mais caros e deixarão de atender aos mais carentes. No Senado, a oposição tentará barrar o texto ou pelo menos “reduzir danos”, alegando que a população mais pobre, que depende de determinados serviços da estatal, será prejudicada e terá de pagar mais caro.

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Entre os que defendem a privatização, os principais argumentos são a melhoria dos serviços e a diminuição de preços causada pela maior competição em determinados itens que hoje são monopólio da estatal. A empresa, no entanto, só possui o monopólio postal, para envio de correspondências (cartas). O carro-chefe da companhia são as entregas de encomendas, especialmente as de e-commerce, serviço já realizado por empresas privadas no país.

O impacto no bolso do consumidor só poderá ser mensurado com a regulamentação. Mas a tendência, segundo especialistas, é de alta nos preços praticados, já que os Correios operam em locais de difícil acesso e alto nível de periculosidade — o que resulta em mais custos com seguros e transporte, que podem, eventualmente, ser repassados aos consumidores.

De acordo com o texto aprovado, a empresa que se tornar dona dos Correios poderá definir preços, condições e reajustes de preços (estes regulamentados pelo contrato de concessão). Para que a universalização dos serviços não seja prejudicada, é prevista a criação de uma “tarifa social” para usuários carentes.

Para Joelson Sampaio, coordenador do curso de economia da FGV EESP, a privatização, por si só, não é suficiente para melhorar os serviços, tudo dependerá da regulação. “É preciso ter regulação para que a empresa consiga manter a oferta de serviços para todos os brasileiros. Cabe ao governo manter esses encargos, não focar só em quem traz maior retorno financeiro”, pontuou.

Ele acredita que ainda não é possível cravar que as tarifas de serviços ficarão mais caras. “A empresa pode cobrar o que ela quiser, até um limite. Hoje muitos serviços públicos são operados por empresas privadas, mas elas não podem cobrar o que querem”, diz ele. Sampaio acredita que o aumento da competitividade pode, na verdade, baratear os serviços.

“O governo vai poder quebrar o monopólio para alguns serviços. Embora a gente tenha concorrência, ainda não é plena. A entrega de conta de luz e água em alguns estados só é feita pelos Correios. Precisamos de mais concorrência, o que pode melhorar os preços, isso é positivo”, opinou o economista.

Já Josilmar Cordenossi, professor de Economia da Universidade Presbiteriana Mackenzie, acredita que haverá uma alta nas tarifas de serviços, mas ela não ocorrerá de uma forma generalizada. “Eu acho que vai ter aumento de preços. Alguns serviços têm preço maior, inclusive quando há maior risco de roubo de carga. A entrega de compras feitas pela internet, por exemplo, pode ficar mais cara, porque muitos produtos são caros e frágeis”, afirmou.

Interessados
Cardenossi afirma, no entanto, que a competitividade pode elevar a qualidade dos serviços prestados, e que acredita que as grandes empresas de e-commerce serão as principais interessadas em adquirir os serviços dos Correios. “A venda dos Correios pode atrair interesse de empresas do e-commerce, pode ser interessante ter um canal de distribuição mais forte, dominar esse meio e diferenciar-se dos concorrentes”, afirmou.

Para Cordenonssi, a privatização é positiva. Ele diz ser a favor de toda privatização de serviços que podem ser prestados pela iniciativa privada. No caso dos Correios, argumenta, trata-se de uma “estatal deficitária que consome recursos do Estado”. Alerta, no entanto, que não basta “privatizar e esquecer”, é preciso fiscalizar a empresa que adquirir a estatal.

“Hoje, o Estado tem o papel de regulamentar e fiscalizar a si mesmo. Mas quando ele é regulador e fiscalizador de outro agente, possui mais força, pode fazer cumprir contratos ou ameaçar retirar a concessão da empresa que não cumprir suas obrigações contratuais”, finalizou.

De acordo com o texto aprovado na Câmara, os Correios poderão ser vendidos integralmente. A previsão é de que um leilão seja realizado já no início de 2022. Com isso, uma série de mudanças é esperada, como a transformação da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) em Agência Nacional de Telecomunicações e Serviços Postais, para regulamentar e fiscalizar os serviços postais.

“A venda dos Correios pode atrair interesse de empresas do
e-commerce, pode ser interessante ter um canal de distribuição mais forte, dominar esse meio e diferenciar-se dos concorrentes”
Josilmar Cordenonssi, professor de Economia da Universidade Presbiteriana Mackenzie.